O tempo que o tempo tem

Taynara Gregório
3 min readDec 4, 2023
Photo by Jason Mitrione on Unsplash

Sempre tive uma questão com o tempo.

Quando criança, queria que ele passasse rápido. Certa vez, minha mãe conseguiu uma piscina de plástico (daquelas de 1.000 litros) emprestada e, ao chegar da escola, fui surpreendida com aquele delicioso corpo de água disponível para mim e minha irmã. No entanto, ainda não poderíamos nadar: eram seis da tarde e só se pode nadar de dia. Decidimos, então, dormir o quanto antes, pois quanto mais cedo dormíssemos, mais rápido o tempo passaria e logo o amanhã chegaria e poderíamos nadar.

De certa forma, sempre quis acelerar o tempo. Aquela ideia boba de criança que acha que ser adulto é o máximo. Isso durou até, mais ou menos, o início dos vinte anos. Um dos meus maiores medos quando era adolescente era não entrar na faculdade aos dezoito anos. Não entrei, mas ainda assim formei bem nova, aos 23. Quando concluí a graduação, desejei parar o tempo porque não sabia o que fazer com ele. Um ano depois, estava formada, morando sozinha em um apartamento de três quartos em meio a uma pandemia. O que fazer com tanto tempo livre?

Enquanto isso, vivia uma briga eterna com minhas relações amorosas, pautada também no tempo. Estabeleci, inicialmente de forma inconsciente, que minhas relações só duravam dois meses. Comprometida com aquela ideia, vivi por volta de um ano e meio (sempre focada no tempo!) de relações-de-dois-meses. Era chegar próximo dessa data de validade que eu me desdobrava de todas as formas possíveis para terminar a relação e, dedicada que sou, conseguia. Até que veio uma relação que durou mais de ano e quebrou com minha regra — e uma parte do meu coração também.

A relação com o tempo mudou na pandemia, mas mudou, principalmente, depois dos vinte e cinco. Meu metabolismo e meu corpo sempre foram meus aliados, mas depois desse marco parece que eles estão se juntando e, ano após ano, travam uma intensa batalha comigo. Até agora estou ganhando, mas até quando?

Hoje estou mais perto dos 30. Aqueles 30. Não sonho com casa e filhos, mas sim, em ter mais tempo. Vivo uma rotina louca. Durmo contando por quanto tempo vou conseguir dormir. Acordo pensando em quanto tempo terei até ter que trabalhar. No trabalho, começo a jornada dando play em um timesheet que contabiliza exatamente quanto tempo gasto em cada atividade. Essa rotina está tão internalizada em mim que várias vezes me pego querendo finalizar o cronômetro mesmo quando estou fazendo outras coisas (por exemplo, escrevendo essa crônica).

Ao longo do dia, penso em como posso ter mais tempo para aliar trabalho, mestrado e todo o resto da vida em vinte e quatro horas. Sinto minha respiração acelerar ao perceber que não sei como gerar mais horas no meu dia. É fazer o que dá com o que tenho.

No semestre passado, por ironia do destino, fiz um mini curso sobre a ontologia do tempo e apesar de não entender metade do que cada autor pensa sobre o tempo, refletir sobre o impacto dessa força na vida humana me fez pensar em como tudo só existe por meio dele. O tempo cronológico, o tempo experienciado, o tempo histórico… somos viciados em medir tudo em tempos. O tempo de um TikTok ou de uma vida bem vivida. O tempo que vendemos para uma empresa ou o tempo que roubamos para nós em um domingo de manhã. É preciso roubar aquilo que já é nosso?

Estamos correndo atrás do tempo perdido ou valorizando nosso tempo?

Será que tenho tempo para tudo o que quero? Para ler as 116 newsletters não lidas na minha caixa de e-mails? Para estudar a fundo os fundamentos da sociedade de controle segundo Deleuze? Para aprimorar minhas habilidades de criação de conteúdo para redes sociais? Para escrever? Para amar, me alegrar, experienciar, descansar?

Não tenho a resposta agora. O tempo acabou e preciso dele emprestado para poder revendê-lo.

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Taynara Gregório

Jornalista e comunicadora | “Escrevo como quem manda cartas de amor”